No dia 16 de julho de 1950, o Brasill perde a Copa do Mundo para o Uruguai por 2 a 1. Esse dia ficou conhecido como Maracanazo. Até então a maior vergonha da história do nosso futebol. Fazem 70 anos nesse dia 16 de julho de 2020. No futebol, temos a falsa impressão que a realidade dos jogadores é pintada de ouro. Ledo engano. A grande maioria ganha até um salário mínimo, quando recebem. Muitos não conseguem realizar seus sonhos que vão se perdendo nesse campo de ilusões. Como detesto o esquecimento, vou procurar contar as injustiças que viveram alguns dos personagens dessa história: Juvenal, zagueiro central da seleção e Barbosa, o goleiro que passou a sua vida inteira sendo culpado pelo segundo gol do Uruguai. Por ser um goleiro negro, ficou refém da solidão por toda sua vida. Os goleiros negros até os dias de hoje são minoria no futebol. O racismo continua fazendo suas vítimas. O técnico Parreira, da seleção da Copa de 1994, não quis receber o goleiro Barbosa nos treinos da seleção brasileira, pois achava que dava azar. Barbosa continuou sua vida carregando esse estigma e esse peso injustamente.
Me lembro de uma cena que me emocionou, onde ele já velho, se levantou colocando a mão no seu coração brasileiro ouvindo o Hino Nacional numa partida de futebol. Um grande exemplo de um homem que, mesmo com todo o seu sofrimento, carregando uma culpa que não foi sua, jamais perdeu o amor pelo seu país. Morreu esquecido e o racismo sorriu de alegria.
Na grande final, todos sabiam que o Brasil merecidamente era o franco favorito. Vinha de uma campanha espetacular. Mas no futebol, a pior cegueira é querer enxergar só a bola. O imponderável iria acontecer. Friaça faz o primeiro gol do Brasil e mais de 200 mil torcedores foram à loucura. O país em total êxtase. A festa para o favorito Brasil já estava sendo comemorada dias antes da grande final. Os dirigentes viviam uma euforia que contaminou e atrapalhou o emocional dos jogadores brasileiros.
As palavras e a liderança do capitão do Uruguai, Obdulio Varela, conhecido como El Negro, entraram na alma dos uruguaios. Antes do time do Uruguai entrar em campo, o barulho da torcida era ensurdecedor. El Negro olhou para seus companheiros e disse: "Não olhem para cima, e não amarrem as chuteiras com cordões, mas com as veias". Por causa desse espírito, o Uruguai não sentiu o primeiro gol do Brasil. O ponta-direita do Uruguai, Alcides Edgardo Ghiggia, passou pelo lateral Bigode e Juvenal saiu na cobertura. Chiggia tocou no meio da área onde estava o perigoso centroavante, Juan Alberto Schiaffino, que empatou o jogo.
Um silêncio sepulcral calou a euforia de todos. O jogo foi sendo jogado e mais uma vez, Chiggia dribla o Bigode e vem a caminho da área. Juvenal ficou na dúvida se saía pra cobrir ou ficava marcando o perigoso Schiaffino. Para sua surpresa dele e de todos os brasileiros, Chiggia deu um chute que passou rente à trave do lado esquerdo, Barbosa não consegue defender e o Uruguai vira o jogo: 2 a 1 para os uruguaios. O impossível aconteceu. O Uruguai se sagra campeão do mundo. Obdulio Varela disse: "Vamos embora que a taça é nossa". Ficou surpreso porque depois do jogo, os dirigentes uruguaios abandonaram os jogadores.
O tempo continua correndo livre, passando rápido na sua velocidade infinita. Não existem marcadores implacáveis para parar o tempo. O destino mais uma vez entra em campo com suas ironias. Os dirigentes da CBF resolvem homenagear o carrasco do Maracanã da Copa de 1950, Chiggia. Iriam imortalizá-lo marcando seus pés na calçada da fama, no templo mundial do futebol. Enquanto Chiggia era homenageado, o zagueiro Juvenal estava sendo enterrado no interior da Bahia. Morreu pobre e esquecido, enterrado na sua própria solidão. A vitória tem muitos pais, mas a derrota é órfã.