O lixo nosso de cada dia

OPINIÃO - Nelson Roberto Bugalho

Data 26/03/2022
Horário 06:07

A educação ambiental é dos instrumentos da Política Nacional de Resíduos Sólidos, e isso não é à toa. É o reconhecimento de que o desenvolvimento socioeconômico, a garantia de um meio ambiente ecologicamente equilibrado e a proteção da dignidade da vida humana estão condicionados a um fator essencial: um padrão de comportamento colaborativo da população nas múltiplas relações com o meio em que vive.
Lamentável não tenha sido dispensado a esse “relacionamento” o devido valor. A queda de braço entre alguns setores da economia com a legislação ambiental acaba pondo tudo a perder. Ninguém ganha, todos perdem.
Essa percepção de perda para “os dois lados” depende, contudo, da nossa capacidade de compreensão dos problemas gerados pelas atividades humanas no meio em que vivemos. E isso se verifica em questões até, de certa forma, banais. 
Quem lembra do Sujismundo? Certamente quem nasceu até o início dos anos 70 sim. Era uma personagem de animação utilizada em filmes de publicidade para a TV na década de 70, com o lema: “Povo desenvolvido é povo limpo”.
Era uma tentativa de conscientizar a população a ser mais colaborativa com a limpeza das cidades. Essa era a “mensagem”.
Aquela campanha publicitária certamente converteu muita gente, embora até hoje não tenhamos atingido o patamar de sociedade economicamente desenvolvida. Como consequência, se o lema está correto - e parece que sim, isso explica o comportamento de parcela da população que insiste fazer dos lugares públicos a lixeira da sua casa.
Diversamente do que ocorre hoje, tivemos grandes avanços legislativos na proteção do ambiente nas décadas de 60, 70 e 80. Aliás, os anos 70 foram marcantes, e inesquecíveis para quem os vivenciou, a exemplo de 1976, retratado como “o ano que nunca terminou”, por conta da morte de JK e Jango nesse mesmo ano.
Nos dias atuais, não creio alguém tão simplório como o Sujismundo seja capaz de converter o cidadão não colaborativo num cidadão que concretamente faz algo pela sua cidade. Seria ele capaz de convencer as pessoas a não cuspirem o chiclete na rua? O fumante a não jogar a bituca do cigarro pela janela do carro? Ou convencer alguém que aquele móvel que não tem mais utilidade ou que perdeu sua beleza não pode ser dispensado na calçada ou em algum fundo de vale?
Uma campanha educativa como aquela dos anos 70 seria interessante e talvez pudesse ter algum efeito na construção de um costume mais colaborativo. Mas, sem dúvida, com outra personagem, até porque no estágio atual de “deseducação” somente alguém com um poder de persuasão e sedução poderia converter ou convencer parcela da população a agir de outra forma. Talvez uma figura mitológica como uma “sereia”, até porque os ambientes aquáticos são os mais emporcalhados pelo lixo que produzimos. Uma ruptura com o atual padrão de comportamento só mesmo com um “feitiço”, posto que encanta.
Como o “feitiço” a que me referi é fruto da imaginação criativa do passado, resta mesmo apostar num modelo de educação capaz de converter as pessoas em cidadãos compromissados com sua cidade, com a saúde pública e com o meio ambiente. De qualquer forma, é uma tristeza pensar que é necessário tanto esforço para conquistar algo que está tão claro, tão óbvio.
 

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