Para entidades, inserção social é entrave para jovens com deficiência

Associação de Proteção aos Cegos, Núcleo Tterê e Associação de Apoio ao Fissurado Lábio Palatal contam um pouco sobre os desafios diários enfrentados pelo público

- SANDRA PRATA

Data 28/11/2018
Horário 09:48

Seja deficiência física, intelectual, visual ou qualquer outra, as limitações estão presentes no cotidiano. Para a psicóloga Luciana de Paula Alves, “é dever da sociedade aprender a lidar e receber as diferenças dos outros”. É com esse objetivo que entidades filantrópicas de Presidente Prudente trabalham para promover a inserção social de deficientes. Todavia, como expõem, isso nem sempre é uma tarefa fácil. Sobre este cenário de inclusão, a Associação de Proteção aos Cegos, Núcleo Tterê e Associação de Apoio ao Fissurado Labiopalatal contam um pouco sobre os desafios diários desse intermédio.

Fundado em 1991, o Núcleo Tterê promove atividades, oficinas e ações de aprendizado lúdico. Assim, atende 280 pessoas, a partir de nove anos, com múltiplas deficiências. Entre elas, física, intelectual, visual e auditiva. De acordo com a coordenadora Patrícia Navarro Fernandes Coelho, inserir um jovem deficiente é difícil, mas inseri-lo em Prudente é “muito mais”. Diz isso porque, conforme ela, a cidade não pode ser classificada como adequada a este público. “Mas não é apenas o poder público, é uma mescla de situações, falta consciência e respeito ao próximo. Digo isso por parte das próprias pessoas que fazem parte do nosso convívio. É comum vermos vagas de estacionamento que, supostamente seriam destinadas para deficientes, sendo ocupadas por quem não é. Tudo isso é falta de consideração e dificulta a participação da pessoa com deficiência no meio em que vive”, ressalta.

Em nota, a Seplan (Secretaria Municipal de Planejamento, Desenvolvimento Urbano e Habitação) informa que, quanto à falta de rampas, a pasta cobra laudo de acessibilidade para aprovação e regularização de construções comerciais no município. Em alguns casos, a Prefeitura também executa as rampas de acessibilidade nos chanfros de esquina das vias públicas, sendo a Sedepp (Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico) a responsável pela fiscalização. “Desta forma, o município está empenhado em promover a acessibilidade e a locomoção nos espaços públicos e particulares”, expõe.

Ainda segundo Patrícia, uma das principais queixas dos jovens, em especial os deficientes físicos, são os preconceitos dos quais são alvos. Entre as situações, a coordenadora destaca o bulliyng relacionado a questões de condição física. “A permanência deles nos lugares depende da recepção das pessoas. Se o mundo não está preparado para eles, a tendência é que se sintam retraídos e permaneçam fechados em um mundo particular”, expõe.

NA ESCOLA

Todavia, em alguns casos, os problemas estão focados em um só ambiente e, de acordo com a coordenadora Maria Inês de Souza, esse local é a escola. Responsável pela Associação de Apoio ao Fissurado Labiopalatal, que atende 130 crianças, adolescentes e adultos, ela diz que, embora não possa generalizar, muitas instituições de ensino não estão preparadas e nem se esforçam para receber deficientes, em especial os que atende. “Isso não é uma questão apenas da cidade, é do país, é algo comum de se ver, relatos de situações de preconceito”, conta.

Com isso, Maria Inês relembra um episódio marcante, quando um dos assistidos da entidade disse se sentir desconfortável em sala de aula. O motivo era um professor que imitava a forma “diferente” que ele falava. “Foi uma situação bem chata e que tivemos que fazer todo um trabalho com o jovem. Ele começou a ficar sem graça de conversar e abrir a boca, são pequenas atitudes para uns, mas muito significativas para quem passa pelo problema”, explica. Porém, afirma que esse foi um caso isolado, já que, “na maioria das vezes, o preconceito surge entre os próprios colegas de classe”.

PRIMEIRO EMPREGO

Mas, depois de um estudo completo, todo cidadão, em especial os jovens, sonha em conquistar o primeiro emprego e um espaço no mercado de trabalho. Para que isso também seja uma realização dos deficientes visuais, a Associação de Proteção aos Cegos atua como o elo entre o indivíduo e as oportunidades. Segundo a assistente social da entidade, Camila Góes Benvenuto, o objetivo é promover a independência, autonomia e mostrar que são capazes. “Ensinamos braile, soroban, informática. Hoje, com a tecnologia, eles podem fazer tudo em um computador, e a ideia é prepará-los para a vida mesmo”, ressalta.

Entretanto, conforme Camila, a realidade ainda é muito dura com aqueles com problemas visuais. “Não posso dizer por todas as deficiências, mas a visual, acredito que seja a que enfrenta mais dificuldades para conseguir um emprego. As pessoas não tiram da cabeça a ideia de que o cego é incapaz”, lamenta. Ainda, segundo ela, embora os deficientes possuam uma cota que dá o direito a uma vaga de emprego, muitas empresas contratam por um tempo e depois os demitem. “Temos atendidos hoje que são capazes de atuar como telefonistas, recepcionistas, mas o que falta são pessoas que acreditem no potencial deles”, expõe.

REVERSÃO DO CENÁRIO

O mundo social, muitas vezes, pode ser responsável por afetar a autoestima e acarretar nos mais diversos problemas psicológicos, conforme afirma a psicóloga Luciana. E isso pode se potencializar na fase da adolescência. “Ele precisa ser visto, fazer parte e entender que pertence ao grupo de pessoas. Sem isso, será uma pessoa insegura e com sentimento de desvalorização, podendo interferir na sua qualidade de vida e até mesmo na sua saúde mental”, pontua.

Com esse objetivo, a Associação de Apoio ao Fissurado Labiopalatal desenvolve os grupos de interação entre os jovens. De acordo com Maria Inês, as reuniões ocorrem semanalmente e, com o apoio de um psicólogo, os assistidos discutem temas como mercado de trabalho, cidadania, sexualidade, entre outros. “Queremos que consigam se relacionar com pessoas da mesma idade, conversar sobre assuntos de jovens e estabelecer vínculos de amizade. Isso é muito importante em um mundo que não abre essas oportunidades”, explana.

Ainda para Maria Inês, o mundo e as pessoas não irão mudar com a convivência, mas sim com a noção de que o preconceito já faz parte da cultura do país. “Já está arraigado nas nossas origens, temos repulsa ao diferente, ao deficiente, ao gordo, ao magro, ao baixo, ao alto. É preciso informação e concepção de que não somos melhores que ninguém e que diferenças não existem para serem excluídas e, sim, respeitadas”, frisa.

Perfil

                                                                       Marcio Oliveira

Nome: João Luiz Ferreira

Idade: 14 anos

Curso: 9º ano

Escola: Escola Estadual Arlindo Fantini

Deficiência: Física

O Imparcial: Como e quando começou a ser dependente da cadeira de rodas?

Nasci sem as forças nas pernas. Durante a gestação, minha mãe teve uma complicação e desenvolvi mielomeningocele, ou seja, desde bebê já sabiam que eu não conseguiria andar. Na época, os médicos disseram que foi por falta de ácido sulfúrico. Passei por diversas cirurgias e tratamento de fisioterapia. Hoje consigo movimentar as pernas, porém, não tenho forças para levantar e andar, então, dependo 100% da cadeira de rodas.

Como lidou com a sua condição conforme foi crescendo? Como é o suporte dos seus pais?

Como eu nasci assim, não conheço outra sensação, então, para mim foi tranquilo me aceitar, não tive nenhum problema no sentido de me revoltar ou não absorver a vida como ela é. Minha família também sempre me apoiou e acredito que isso me ajudou muito também, não sei como seria se não tivesse meus pais comigo.

Já passou por alguma situação de preconceito por ser deficiente físico? Como lidou?

Não, graças a Deus. Infelizmente, sabemos que existe muito preconceito, que as pessoas realmente excluem as outras em decorrência de suas condições físicas. Mas eu acredito que, por ter sorte de ter uma boa família, nunca estive em contato com pessoas mal-intencionadas no meu cotidiano. Mas não é todo mundo que tem essa sorte. Acredito que, se um dia acontecesse, eu não ficaria tão afetado. Como eu disse, tenho uma ótima aceitação de quem eu sou e das minhas condições, não acho que algo que digam iria me abalar.

Hoje você pratica badminton e natação. Como se encontrou no esporte e de que forma ele contribuiu para sua vida?

Eu morava em Londrina [PR]. No ano passado me mudei para Presidente Prudente e conheci um amigo. Na época, ele me falou se eu não teria vontade de praticar algum esporte, ele treinava badminton e me falou sobre como funcionava, me interessei e conheci a treinadora. Depois disso me aproximei da natação também e, desde então, não parei mais, isso faz 10 meses. Acredito que a principal contribuição foi no sentido de fazer amizades. Eu não conhecia muita gente aqui, vivia trancado em casa, não saía, então, estar em contato com outras pessoas da minha idade foi ótimo. Já participo de competições e quero continuar investindo no esporte.

Como avalia a acessibilidade para os deficientes físicos na cidade?

Bom, particularmente, não tenho do que reclamar. Claro que pode melhorar, mas se comparar com Londrina, onde eu morava antes, Prudente é bem melhor. Principalmente na questão de rampas de acesso em calçadas.

Qual seu maior sonho, tanto profissional como pessoal?

Não me vejo parando de nadar, isso é uma certeza que tenho, que vou continuar na natação, seja como profissional ou como hobby. Mas também tenho o sonho de fazer faculdade de Gastronomia, apesar de ser novo, gosto muito de cozinhar. Então, diria que meu maior sonho é me formar, trabalhar na área e continuar nas piscinas.

Qual conselho pode dar para outros jovens que, de alguma forma, se sentem limitados?

Não levem a deficiência como um problema. Na verdade, ela é uma oportunidade de mudar a vida e ampliar os pontos de vista. Tudo é possível, nós podemos conquistar tudo que sonhamos e queremos desde que acreditemos nisso. Nada é uma impossibilidade, pode ser uma dificuldade, mas nada que não existam soluções e alternativas.

DICAS DE LIVRO E FILMES

O Começo de Tudo (2014)

                                                                     Divulgação

O livro de Robyn Schneider foi lançado em 2014 no Brasil pela editora Novo Conceito. A história traz a vida de Ezra Faulkner, o “garoto de ouro” de Rosewood, cidade pequena onde vive. Jogador de tênis e um dos jovens mais populares do ensino médio no colégio em que estudava, Ezra saía de uma festa quando foi vítima de um acidente de carro e desenvolveu uma fratura no joelho, que o impedia de continuar jogando e, além disso, andar sem o auxílio de muletas. Revoltado e sofrendo a pressão dos pais - que idealizavam uma bolsa na faculdade por meio dos campeonatos de tênis - Ezra se vê em uma nova situação: reaprender a viver. E, assim como diz o título da obra, o jovem vai, aos poucos, conhecendo novos lados da vida e novas formas de sobreviver. É nesse meio de tempo que conhece Cassidy, a jovem que morava na casa ao lado e Ezra nunca havia notado. O livro é ótimo para fazer pensar sobre como a vida prepara coisas surpreendentes quando não estamos esperando por surpresas.

Colegas (2013)

                                                               Divulgação

O filme brasileiro traz a história de três amigos ligados por duas coisas em comum: a síndrome de Down e a vontade de conhecer o mundo. Stallone, Aninha e Márcio viviam em um instituto especializado quando decidem, de uma hora para outra, que podem e devem explorar o local onde vivem. Munidos com pouco mais de alguns pertences e um carro conversível, os amigos se aventuram pelas cidades do Brasil. Todavia, o que não esperavam era uma cobertura massiva da imprensa em busca do paradeiro deles. A história promete boas risadas e a moral de que todos podem, sim, fazer o que almejam, basta decidir, em um belo dia, e concretizar.

Intocáveis (2012)

                                                                      Divulgação

O filme, de origem francesa, traz a história de Philippe, um aristocrata que, devido a um acidente, fica tetraplégico. A trama gira em torno da amizade que ele desenvolve com seu assistente Driss, pago pela família para se certificar de que estava se cuidando bem. A história mostra de que forma, coisas simples, como sentir a neve, correr em alta velocidade e ver o sol nascer significam tanto para uma pessoa que se encontra presa em uma cadeira de rodas. Um filme para pensar e, principalmente, aprender a valorizar o presente.

AGENDA

Leia Mulheres

Data: Hoje

Local: Quiosque do Sesc Thermas

Endereço: Rua Alberto Peters, 111 - Jardim das Rosas

Telefone: 3226-0400

Horário: 19h

Preço: Gratuito

Atividade: O projeto Leia Mulheres tem como objetivo promover a leitura de autoras femininas, a fim de destacar a imagem da mulher na literatura. Nesta edição, a obra que será debatida é “As Meninas”, de Lygia Fagundes Telles.

Show – Félix Robatto

Data: Sábado

Local: Área de Convivência do Sesc Thermas

Endereço: Rua Alberto Peters, 111 - Jardim das Rosas

Telefone: 3226-0400

Horário: 16h

Preço: Gratuito

Atividade: Nascido em Belém do Pará, Félix leva ao Sesc um pouco de seu repertório como percursionista, guitarrista e pesquisador da música latino-amazônica. O trabalho mostra a música paraense de forma contemporânea com elementos de música latina. 

Circo – Porongo Vaudeville

Data: Domingo

Local: Área de Convivência do Sesc Thermas

Endereço: Rua Alberto Peters, 111 - Jardim das Rosas

Telefone: 3226-0400

Horário: 15h

Preço: Gratuito

Atividade: Explorando linguagens como dança, música, mágica e malabarismo, a apresentação faz uma releitura de grandes shows de variedade do começo do século.

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