O ser humano evoluiu se adaptando para armazenar energia da forma mais eficiente, ou seja, acumulando gordura. No passado foi um mecanismo necessário e eficiente para sobrevivência. Hoje ainda é necessário para a classe menos favorecida que passa fome e em algumas outras situações (catástrofes, guerras etc). Porém, a maioria das pessoas tem alimento disponível e muitos consomem em excesso. O mecanismo de armazenamento funciona muito bem e são acumulados alguns ou até dezenas de quilos (kg) ao longo de meses e anos.
TEMPO
Ao longo do processo de acúmulo de gordura vão sendo estabelecidas adaptações metabólicas, morfológicas (tecidos), nervosas e funcionais. Cerca de 90% das pessoas com sobrepeso e obesidade desejam perder o excesso em poucas semanas ou poucos meses, mesmo quando há mais de uma dezena de kg em excesso. Para os imediatistas, apenas procedimentos invasivos como a lipoaspiração (remoção da gordura por meio de sucção) podem resolver. Mesmo com os procedimentos de gastroplastia (cirurgia bariátrica) e os análogos das incretinas (semaglutida e tirzepatida), que forçam a diminuição do consumo alimentar e da gordura armazenada, leva tempo para a resolução.
RESISTÊNCIA
O hipotálamo possui neurônios responsáveis pela homeostase do estoque de energia. Esse “ponderostato” é um sensor da quantidade de energia (gordura) acumulada. Funciona ativando mecanismos para prevenir o ganho e a perda de peso. Alterações do estoque de gordura para mais (excessos alimentares) ou para menos (dietas restritivas) são percebidas e fazem o hipotálamo disparar mecanismos de correção: mais ou menos fome e maior ou menor gasto de energia.
Fazendo apenas dieta com restrição calórica moderada ou utilizando análogos das incretinas, a prática de exercícios é grande aliada.
EFICIÊNCIA
Esses mecanismos de prevenção de alterações no peso corporal são redundantes e eficientes, contando com hormônios e neurotransmissores para regular a orexia/fome, anorexia/saciedade e a taxa metabólica, determinante do maior ou menor gasto de energia, mesmo em repouso - a termogênese adaptativa. Porém, essa eficiência pode ser sobrepujada quando as alterações no consumo, para mais ou para menos, persistem por meses. Os análogos das incretinas alteram a atividade do neurônio orexígenos (da forme).
“PESO NORMAL”
Dietas temporárias “sempre falham” porque a pessoa permaneceu por anos com o sobrepeso, tendo sido alterado o parâmetro de “peso normal” no hipotálamo. Na dieta com déficit de energia, quando a gordura (energia armazenada) começa a diminuir, entram em ação os mecanismos de preservação. Disciplina e manutenção da dieta (além dos medicamentos) podem sobrepujar esses mecanismos. Não é o caso das dietas da moda, que duram poucas semanas ou meses, tempo insuficiente para alterar novamente o parâmetro de “peso normal” no hipotálamo.
JOGO VENCEDOR
Fazendo apenas dieta com restrição calórica moderada (consulte uma nutricionista!) ou utilizando análogos das incretinas, a prática de exercícios é grande aliada, pois contribui com a queima da gordura e com a saúde geral. Uma chave para manutenção do peso: ao atingir o peso desejado conte os Kg que perdeu e permaneça na dieta de manutenção pelo mesmo número de meses. Mas lembre-se, a dieta adequada deve ser mantida até o fim da vida, como um jogo infinito.
Referências
Boguszewski, C.L.; Paz-Filho, G.; Velloso, L.A. Neuroendocrine body weight regulation: integration between fat tissue, gastrointestinal tract, and the brain. Endokrynologia Polska: Polish Journal of Endocrinology, Vol. 61. Num. 2. 2010. p. 194-206.
Doucet, E.; St-Pierre, S.; Alméras, N.; Després, J.-P.; Bouchard, C.; Tremblay, A. Evidence for the existence of adaptative thermogenesis during weight loss. British Journal of Nutrition. Vol. 85. 2001. p. 715-23. doi: http://dx.doi.org/10.1079/BJN2001348
Friedman, J.M. Leptin and the regulation of body weigh. Keio Journal of Medicine. Vol. 60. Num. 1. 2011. p. 1-9. doi: http://dx.doi.org/10.2302/kjm.60.1
Heymsfield, S.B.; Harp, J.B.; Reitman, M.L.; ...; Pietrobelli, A. Why do obese patients not lose more weight when treated with low-caloric diets? A mechanistic perspective. American Journal Clinical Nutrition. Vol. 85. 2007. p. 346-54.
Huda, M.S.; Wilding, J.P.; Pinkney, J.H. Gut peptides and the regulation of appetite. Obesity Reviews. Vol. 7. 2006. p. 163-82. doi: http://dx.doi.org/10.1111/j.1467-789X.2006.00245.x
Macias, A.E. Experimental demonstration of human weight homeostasis: implications for understanding obesity. British Journal of Nutrition. Vol. 91. 2004. p. 479-84. doi: http://dx.doi.org/10.1079/BJN20031051
Miyawaki, T.; Masuzaki, H.; Ogawa, Y.; ...; Brüning, J.C. Control of energy homeostasis by insulin and leptin: Targeting the arcuate nucleus and beyond. Physiological Behavior. Vol. 97. Num. 5. 2009. p. 632-8. doi: http://dx.doi.org/10.1016/j.physbeh.2009.03.027
Sparling, P.B.; Franklin, B.A.; Hill, J.O. Energy Balance: the key to a unified message on diet and physical activity. Journal of Cardiopulmonar Rehabilitation and Prevention. Vol. 33. Num. 1. 2013. p. 12-5. doi: http://dx.doi.org/10.1097/HCR.0b013e3182721568
Sumithran, P.; Proietto, J. The defence of body weight: a physiological basis for weight regain after weight loss. Clinical Science (London). Vol. 124. Num. 4. 2013. p. 231-41. doi: http://dx.doi.org/10.1042/CS20120223
Velloso, L.A. The brain is the conductor: diet-induced inflammation overlapping physiological control of body mass and metabolism. Arquivos Brasileiros de Endrocrinologia e Metabologia. Vol. 53. Num. 2. 2009. p. 151-8. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0004-27302009000200006