Sertão

OPINIÃO - Thiago Granja Belieiro

Data 02/12/2021
Horário 05:00

Durante o século XIX, no Brasil Império, dizia-se que o sertão começava onde terminava a Avenida Rio Branco, principal via da então capital do país. Com essa anedota, as elites cultas do Império queriam enaltecer a suposta civilidade do Rio de Janeiro, em contraposição aos interiores supostamente incultos. No início do século XX, Euclides da Cunha publica “Os Sertões”, verdadeira epopeia que narra a luta pela sobrevivência de sertanejos pobres contra a opressão dos coronéis e da República recém instalada. 
Mas é com Guimarães Rosa, em “Grande Sertão: veredas”, que a ideia do sertão não apenas como lugar seco e pobre, mas, sobretudo, lugar de ausência da lei, do Estado e da civilização se consolida no imaginário nacional. Dialética do culto e do inculto, da civilização e da barbárie, da sensibilidade e da rudeza, da sofisticação literária com a beleza da cultura sertaneja do interior das gerais. A ideia de sertão, mais do que tudo isso, revela ainda a dualidade entre litoral e interior, entre as capitais do país e seus sertões de dentro. 
Em mapa do final do século XIX, a região de Presidente Prudente aparece denominada como “terrenos despovoados” e em outras cartas geográficas, simplesmente sertão. Isso ocorria uma vez que desprezava-se a presença das tribos indígenas que habitavam a região, de matriz cultural Tupi-Guarani, e denotava-se ainda, a ausência da civilização nessas terras distantes da capital do Estado. 
Passados mais de um século da ocupação do oeste de São Paulo, será que podemos pensar a região de Presidente Prudente como sertão? Dialeticamente, eu diria que sim. Região mais pobre do Estado, com um processo histórico marcado pela dizimação dos povos indígenas, com alta concentração fundiária, histórico de lutas pela terra e conflitos agrários, pobreza mal disfarçada, renda média baixa, ausência de indústrias e atividades culturais de vulto, ausência de contradições no debate público, falta de criticidade aos problemas regionais, ausência completa de um projeto de desenvolvimento regional, e o predomínio de um certo coronelismo pós-moderno me fazem crer que sim, estamos no sertão. 
No sertão estamos e não estamos, numa adaptação livre do pensamento de Heráclito. No fundo, o sertão está dentro ou fora de nós. 
 

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