Silêncio Quebrado na Fila

O Espadachim, um cronista a favor do tatu e do Tatuapé

OPINIÃO - Sandro Villar

Data 10/07/2020
Horário 05:00

Já era quase hora do almoço, perto do meio-dia, quando os ponteiros do relógio se encontram, e a fila dobrava o quarteirão em uma lotérica, aquela que vende sonhos e ilusões por meio de jogos legalizados pelo governo federal. Jogo do bicho? Não! A Caixa não admite concorrência.
Mas, voltando à vaca fria e ao boi quente, a fila não só dobrava o quarteirão como também era, por assim dizer, quilométrica. Quantas pessoas, entre apostadores e pagadores de contas, estavam na fila? Dezenas? Centenas? Sim, eram centenas, gente velha e gente nova. 
A fila é democrática, cada um que espere a sua vez de ser atendido nas lojas em geral. Só que não pode demorar muito, pois deixa a pessoa irritada, mal-humorada ou qualquer outra classificação que o leitor(a) achar mais adequada.
Um detalhe: o silêncio era ensurdecedor e só era quebrado quando passavam carros e ônibus pela Avenida Ana Jacinta, onde fica a casa lotérica. Ninguém conversava, ninguém puxava conversa, todo mundo mais triste do que um tango de Gardel, enfim, de cara amarrada. Amarrada não sei com o quê, já que não havia corda ou barbante por perto, mas isto é apenas mais uma metáfora, maior nonsense. 
Uma situação melancólica. Do jeito que caminha a humanidade não poderia mesmo ser diferente. No momento, não há motivos para jogar conversa fora, contar piadas e falar de projetos. Do jeito que estava a fila, com toda aquela tristeza estampada no rosto das pessoas, se algum engraçadinho contasse uma piada poderia receber olhares de reprovação.
Rir de quê atualmente? Complicado, meus camaradas e minhas camaradas. Mas, como num passe de mágica, houve um momento de descontração, que quase resultou em tensão. Alguns senhores, de cabelos "nevados", começaram a falar de política e elogiaram o Lula. Aliás, falar de política é sempre bom, pois política, como se dizia na Grécia antiga, é a arte do possível.
Só que estamos no Brasil de 2020 e por aqui as coisas estão mais para urubu do que para beija-flor. "No governo do Lula o arroz e o dólar estavam baratos", comentou um apoiador do ex-presidente. Um bolsonarista reagiu observando que a situação, agora, está melhor. "Tem menos burocracia", disse o homem, de máscara preta e cabelos cor de leite, bem branquinhos. Sua afirmação foi corroborada por outros bolsonaristas.
Ainda bem que os lulistas e os bolsonaristas não saíram no tapa, não saíram no braço e nem no antebraço. Ao contrário, deram sonoras gargalhadas, sinal de que tudo terminou bem. Ainda sobre política, vale lembrar o que disse o Juninho Pernambucano: "Noventa por cento dos meus parentes não falam mais comigo por causa das discussões políticas". 
Coisas que acontecem. Os dias estão assim. Abaixo o radicalismo. E quanto à fila quilométrica, continuava extensa no começo da tarde, mas sem dobrar o quarteirão.

DROPS

Bolsonaro positivo e operante.
(Aroeira, chargista)

Pimenta nos olhos dos outros é colírio.

A vida tem seus altos e baixos, a começar pelo basquete e o turfe.

Egoísta é o sujeito que diz "farinha pouca, meu pirão primeiro".

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