Em entrevista a O Imparcial, o sociólogo Marcos Lupércio Ramos avalia a problemática da superlotação carcerária como uma “doença crônica”, não só na região de Presidente Prudente, mas, sim, no Estado de São Paulo e no Brasil, com raízes profundas na história do sistema prisional. “O ápice dessas revoltas dentro de presídios talvez tenha sido o massacre do Carandiru, em São Paulo, em 1992. A questão é: ‘por que é um problema crônico?’”, inicia o sociólogo.
Segundo Ramos, há várias possibilidades para explicar as razões para a perpetuação de uma das questões mais espinhosas e controversas do país. Uma delas seria a visão punitivista no imaginário popular de que o encarceramento serve não apenas para isolar criminosos, mas também para puni-los de forma severa, independentemente da gravidade do crime.
Ele também critica a abordagem de políticos, especialmente os de viés mais conservador, que adotam essa percepção como solução para a criminalidade, implementando medidas como o fim das saídas temporárias – aprovada pela Câmara dos Deputados em maio deste ano - e o aumento de penas. “Esse tipo de política piora a situação e acaba tornando as prisões em um caldeirão pronto para explodir, além de tornar esses locais um solo fértil para o domínio de facções criminosas”, diz Marcos Lupércio Ramos.
“Aumento de pena, fim das ‘saidinhas’, criação de novos delitos passíveis de prisão ou, como se tem tentado em diferentes momentos, a diminuição da idade penal, não resolvem o problema da superlotação de presídios, ao contrário, só piora”, elenca o sociólogo ao pôr em questão a eficácia do encarceramento como solução para a violência e avaliar que o aumento do rigor penal só piora a superlotação nas prisões.
Para Ramos, há outros fatores, além dos políticos e da percepção popular, que explicam a problemática. “Uma delas é a falta de vontade política para agir em relação à questão da superlotação, que seria pelo caminho de mais investimentos públicos na construção de novos presídios e contratação de funcionários. Não é uma prioridade para governadores essa questão. Alguns caminham até por uma senda ‘fascista’, que perpassa pela diminuição dos direitos humanos de encarcerados ou, simplesmente, pelo não cumprimento das convenções internacionais sobre a questão [dos direitos humanos nas prisões]. Se a questão não é prioritária dentro das políticas públicas estaduais, ela vai sendo ‘empurrada com a barriga’”, examina o especialista.
Marcos Lupércio Ramos observa que, de 1994 a 2012, no Estado de São Paulo, houve um “boom” de construção de estabelecimentos prisionais durante os governos do PSDB (Partido Social Democrático do Brasil). “Depois, gradativamente, os investimentos nessa área foram caindo, apesar do aumento de arrecadação de impostos. Em nível federal, entre os anos de 2003 e 2012, também ocorreram grandes investimentos na área, com a construção de vários presídios federais, a maioria de segurança máxima e, em assim sendo, voltado para o aprisionamento daqueles presos - considerados - de alta periculosidade. Mas a partir de 2013, o país começa a entrar em crise institucional e, depois, a entrar em crise econômica. Com a crise econômica a situação só piorou. Com falta de auxílio dos recursos federais, governos estaduais praticamente ficaram estagnados nessa questão”, rememora o sociólogo.
“Para piorar essa situação, temos um congresso de maioria de deputados e senadores, no mínimo conservadores, que - na contramão de países como Portugal, Uruguai, Holanda, Canadá, parte dos Estados dos Estados Unidos da América, dentre outros, que flexibilizaram legislações, por exemplo, em relação ao porte e uso de determinadas substâncias/drogas, como a maconha - criminalizaram ainda mais esse tópico”, acrescenta.
Por fim, Ramos defende políticas alternativas ao encarceramento, especialmente para crimes de menor gravidade, e sublinha que o problema carcerário também está intrinsecamente ligado a questões de exclusão social e racial no Brasil, o que demanda um debate mais profundo sobre quem realmente é preso no país. “Temos assim uma questão de exclusão social - maioria de pessoas pobres - e também racial - maioria de pessoas negras [pretas e pardas]. Não há soluções fáceis e rápidas”.
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