Sorriso universal

OPINIÃO - Rosana Leal do Prado

Data 12/05/2022
Horário 05:00

Um dos estereótipos atrelado ao brasileiro está ligado à alegria. Não é novidade que o mundo nos conhece como um povo alegre. No entanto, uma das principais expressões dessa alegria, o sorriso, nem sempre esteve estampado no rosto de seu povo nas suas melhores formas. Múltiplas são as razões para isso e dentre elas posso citar: desigualdades sociais, desinformação, falta de acesso a cuidados odontológicos e objetificação do sujeito. Esta última separou a boca do corpo e, inúmeras vezes, tratou a saúde bucal exclusivamente como a realização de procedimentos em virtude de doenças que já tinham produzido danos à vida dos indivíduos, mutilando gerações e relegando a estes viver sem mais nenhum dente natural.
É raro ver sujeitos que não conhecem casos de alguém que já perdeu algum dente, ou mesmo todos eles, em especial entre as pessoas mais velhas ou àquelas mais vulneráveis. No primeiro grupo, a principal causa para tal situação tem maior probabilidade de estar relacionada ao tipo de odontologia praticada no passado, enquanto que entre os ditos vulneráveis, o efeito dos determinantes sociais e a necessidade de fazer escolhas diante de uma vida escassa em recursos, os privou do acesso aos cuidados odontológicos básicos. Quando há a combinação dos dois fatores – idosos vulneráveis – a constatação dos efeitos sobre a saúde bucal é simplesmente devastadora.
Entretanto, foram muitos avanços no conhecimento odontológico ao longo dos últimos anos, mas aquele que de fato todo cidadão brasileiro deveria comemorar, é a maioridade do direito ao qual chamo de ‘sorriso universal’. Denominada Brasil Sorridente, a Política Nacional de Saúde Bucal foi implantada no ano de 2004 e permitiu que bastante coisa mudasse de lá para cá, em especial a ampliação do acesso da população a cuidados odontológicos públicos de qualidade. O Brasil Sorridente também trouxe visibilidade para a atuação do cirurgião-dentista, a qual extrapola as paredes do consultório, supera o zunido do ‘motorzinho’ e se antecipa às queixas dos pacientes, promovendo a saúde, em sua forma integral e reconectando a boca ao corpo. Tal política tem ainda feito valer para a saúde bucal o que a Constituição Federal determina para o Sistema Único de Saúde em seus princípios – odireito ao acesso universal à saúde para a população.
Mas será que isso é motivo suficiente para comemorar? Certamente há muito o que avançar ainda, mas sem sombra de dúvidas é preciso celebrar esses 18 anos da sistematização da oferta de cuidados odontológicos pelo SUS diante de uma população que sempre teve esse direito negado. Oferecê-lo a qualquer cidadão é promover a justiça social. E a mim, professora e sanitarista, cabe celebrar ainda a possibilidade de ajudar a formar quem faz isso acontecer, o cirurgião-dentista do SUS. Testemunhar o idoso vulnerável, antes completamente desdentado, reabilitado com sua ‘dentadura’ é dignificante, uma vez que essa ação devolve, além do sorriso, a alegria à vida das pessoas.
 

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