Sozinha com os dias

OPINIÃO - Raul Borges Guimarães

Data 28/11/2021
Horário 06:15

Ontem eu fui à Brasília para assistir a peça teatral organizada pela escola da Marina para o fechamento do ciclo do ensino fundamental. Grande vitória colocar 30 jovens no palco depois de quase dois anos em completo isolamento!
Enquanto assistia ao espetáculo fiquei pensando nos meus 14 anos pelas ruas de São Paulo. Quantas reuniões no Grêmio estudantil, debates no cine clube da escola, peças de teatro, ensaios de orquestra. Tempos de muitas descobertas e conquistas fora de casa… Nada comparável à experiência de subir no palco e encarar a plateia de frente. “Você precisa falar para quem está na última fileira te ouvir”, dizia a professora Laura! E os exercícios de dicção para a língua não enrolar na hora do espetáculo? Diversão pura…
E lá estava aquela que outrora foi minha netinha, uma linda moça numa apresentação completa… música ao vivo, figurino bem cuidado, iluminação, marcação de palco. Não podia haver um tema mais adequado para o momento: As Mil e uma Noites! Clássicas histórias do mundo persa foram contadas por uma hora e meia de muita animação, cores e ritmos.
Nem dava para imaginar os inúmeros desafios dos bastidores, a começar pela discussão dos cuidados sanitários. Ensaios com máscaras e distanciamento social. A testagem dos atores na véspera do espetáculo para garantir segurança de quem subiria no palco. Sim, depois de tantos esforços, caso o teste de Covid-19 desse positivo, o jovem ator estaria excluído da apresentação. Pense a ansiedade para receber o resultado e a explosão de alegria ao saber que a turma inteira poderia estar ali, todos juntos!
Outra situação curiosa foi revelada pela diretora da peça no final do espetáculo. Dentre seus elogios ao elenco, ela destacou a vontade de se auto-dirigir. Como assim? É que os ensaios avançavam lentamente porque os jovens atores questionavam situações que para eles eram inverossimiveis. Por que o chefe dos 40 ladrões não podia ser uma líder feminista?  (mesmo porque ele era ali representado por uma menina). No final o resultado foi incrível. Foi emocionante assistir aqueles jovens e reconhecer muitas superações diante da extrema timidez de muitos, da dificuldade de dicção e de soltar a voz com a força dos pulmões, da movimentação no palco. 
Nas histórias das mil e uma noites de ontem eu percebi o embrião de uma força muita maior, como no poema “Sozinha com os dias” de Fadwa Touqan, a poetisa da Palestina. Lindos poemas focados nas dificuldades enfrentadas pelas mulheres que as meninas no palco não deixaram no esquecimento.


 

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