Velho e novo mundo

OPINIÃO - Raul Borges Guimarães

Data 06/11/2022
Horário 04:30

O meu escritório precisava de uma boa limpeza. Eu estava cansado de ficar olhando para uma tela de computador mais de quatro horas. Daí eu peguei uma escada e resolvi começar pela prateleira mais alta da estante de livros. Foi quando eu fiz uma descoberta fantástica! Lá estava esquecida há muito tempo uma velha caixa com cartas muito antigas. 
A maior relíquia era uma carta escrita pela minha avó materna em 1977. A minha avó tinha uma letra muito bonita. O texto não passava de 20 linhas, mas era repleto de informações corriqueiras acerca das atividades semanais da minha tia e da prima. Fiquei imaginando a minha avó sentada na mesa da cozinha, com o bloco de notas e a caneta tinteiro que tinha sido do meu avô. Cafezinho mineiro passando no coador de pano e o doce de pão esfriando em cima da pia. 
Por debaixo daquela carta mais antiga havia outras relíquias. Cartas enviadas pela minha mãe no começo dos anos 2000. Era um período de muitas mudanças na minha vida e que, de certa forma, muitos fatos estavam ali registrados ou subentendidos em suas palavras escritas. Por fim, uma dezena de cartas das minhas filhas já moças, descrevendo as primeiras conquistas pelo mundo afora.
Como seres hiperconectados e submersos em informações processadas por computadores talvez não faça mais o menor sentido colocar numa folha de papel informações tão banais. Mas eu fiquei com muita saudade daqueles tempos que vivíamos inúmeras experiências sensitivas que envolvem a escrita à mão. O cheiro da tinta da caneta. O ruído da caneta rabiscando o papel. A presença do corpo inteiro em intenso diálogo com nossas memórias ali expressas numa simples superfície branca. E mesmo o movimento de dobrar e colocar a carta dentro de um envelope, endereçá-lo, colar um selo e levá-lo para uma agência do correio. Sem contar o tempo de espera no passo a passo do carteiro até a entrega na sua residência. Atenção nos mínimos detalhes! Se errássemos a caixa postal, havia o risco de a mensagem nunca chegar ao destino. 
Tudo muito diferente da circulação instantânea dos hipertextos dos dias atuais. Mas eu não acredito que o velho mundo das letras conectadas pelos traços da escrita cursiva seja progressivamente dissolvido no sistema binário da programação digital. É o velho ou o novo mundo? (o que também pode ser escrito no sistema binário dos computadores, como abaixo). 

11001001 00100000 01101111 00100000 01110110 01100101 01101100 01101000 01101111 00100000 01101111 01110101 00100000 01101110 01101111 01110110 01101111 00100000 01101101 01110101 01101110 01100100 01101111 00111111 
 

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