Você se trataria como trata quem ama?

OPINIÃO - Amanda Whitaker Piai

Data 03/07/2025
Horário 04:30

Pode parecer uma pergunta simples, mas a resposta nem sempre é fácil. Repara só: quando alguém que você gosta comete um erro, passa por um momento difícil ou está se sentindo sobrecarregado, é comum que você ofereça acolhimento, tente aliviar, diga palavras gentis. Agora pensa... você faz isso com você?
Muitas vezes, somos duros demais com nós mesmos. Exigentes, impacientes, críticos. Como se errar ou sentir fosse um sinal de fraqueza. Como se a gente precisasse estar sempre forte, produtivo e no controle para merecer um pouco de carinho ou descanso.
Mas sentir dor faz parte da vida. A tristeza, o medo, a frustração... nenhum desses sentimentos é sinal de falha. Eles são apenas sinais de que estamos vivos e de que nos importamos. O problema é quando, ao sentir tudo isso, a gente começa a se cobrar por estar sentindo. Como se, além da dor, ainda tivéssemos que lidar com a culpa por não estar bem.
Autocompaixão é justamente o oposto dessa lógica. É quando você começa a se tratar com a mesma gentileza que oferece aos outros. Não é se fazer de vítima, se isentar de responsabilidade ou fingir que está tudo bem. É reconhecer o que dói sem se machucar ainda mais por isso. É dizer para si: "Está difícil agora. E tudo bem. Eu posso estar aqui comigo."
E não, isso não acontece de uma hora pra outra. A maioria de nós aprendeu, de um jeito ou de outro, que só seríamos dignos quando estivéssemos certos, quando acertássemos, quando “merecêssemos”. Só que a verdade é que o acolhimento não precisa ser conquistado. Ele pode — e deve — ser oferecido no exato momento em que mais nos sentimos bagunçados.
Praticar autocompaixão começa com pequenas pausas. Respirar fundo quando a crítica interna aparece. Reconhecer o que se está sentindo, mesmo sem saber o que fazer com aquilo. Se perguntar: “Se fosse alguém que eu amo, o que eu diria agora?” E, com calma, tentar dizer isso para si mesmo.
Você não precisa estar perfeito para merecer cuidado. Não precisa ter todas as respostas, não precisa estar bem o tempo todo, nem dar conta de tudo para ser digno de acolhimento. Gentileza não deveria depender de desempenho. O amor que você oferece aos outros pode — e merece — ser direcionado também para você. E isso não é egoísmo, é autocuidado. É entender que ninguém floresce sob ataques constantes, nem mesmo quando esses ataques vêm de dentro. Você pode errar, pode se frustrar, pode sentir medo — e ainda assim ser tratado com respeito e ternura. Autocompaixão é isso: não esperar que a dor passe para se cuidar, mas se cuidar enquanto ela está ali. Talvez, no fim das contas, o gesto mais transformador não seja lutar para se tornar alguém melhor… mas se permitir ser quem se é com mais carinho e menos julgamento. E isso, dia após dia, já é um caminho de mudança.

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