O sol da manhã já anunciava o calor que viria, enquanto eu iniciava a missão de casa. Comecei pela área gourmet, no andar de cima, onde a churrasqueira repousa. Aquele lugar me traz tantas lembranças do meu sogro, um mestre na arte de receber, sempre com um churrasco e um sorriso. O perfume das brasas ainda paira no ar, um cheiro que para mim significa família e festa.
Com a árdua tarefa doméstica concluída a pedido da Mulher Maravilha, encerro meus serviços de um marido não afeito a tarefas domésticas, que aliás detesto. O próximo destino é singrar para o Max Muffato. Eu precisava repor o meu segredo mais delicioso: o Licor de Cassis. Foi meu genro André que sempre quando ele vem para a "aldeia sagrada", ele compra sob os protestos da minha filha Flávia, por eu ser um revoltado diabético. O sabor adocicado me conquistou de tal forma que agora já virou um item obrigatório na minha lista de compras.
O carrinho ficou pesado. Além do licor, o Pense Zero da Batavo – nos sabores ameixa e batido – e, em um momento de pura rebeldia, um chocolate Crunch. A cada item que colocava no carrinho, eu pensava na minha “lista negra”. Se o meu querido amigo e médico, o endocrinologista Dr. José Roberto Marcondes, descobrisse, eu estaria em maus lençóis. E se a minha filha Luiza souber... Aí, sim, eu estaria na “roça”. Melhor manter segredo.
No meu fiel Toyota Corolla 2001, uma canção me veio à mente e me transportou para uma época que vivemos intensamente, um hit dos anos 60: "Poor Side of Town", de Johnny Rivers e Lou Adler. Coloquei a música no Spotify e, em um impulso, compartilhei com quem viveu essa época comigo. Meu irmão Roy respondeu: “Johnny 'El Mejor'... que saudades”. O maestro Bayard, do lendário conjunto musical prudentino, Os Sombras, e o nosso eterno “playboy” Nenê Medeiros também receberam a canção. E nossa querida dançarina, a amiga Cristina Miranda, também entrou na viagem: "Persio, essa música tocou no meu aniversário de 15 anos na Apea, se lembra?" Além de lembrar, me senti dançando nesse salão mágico da saudade.
A música resgatou um pedaço da nossa história. “Poor Side of Town” alcançou o topo da Billboard Hot 100 e marcou a mudança de estilo de Johnny Rivers, do rock and roll para uma balada pop-soul. A letra, no entanto, é o que realmente nos toca: a história de uma mulher que, após ser abandonada por um homem rico, volta para os braços do seu antigo amor, que vive no “lado pobre da cidade”. É o contraste da superficialidade versus a profundidade do amor.
Enquanto a melodia, com o seu arranjo orquestral por Marty Paich, preenchia o carro, eu ouvia os versos, sentindo o sol da manhã da minha amada aldeia sagrada aquecer minha pele e meu coração.
“Como você pode dizer o quanto sente minha falta
Se da última vez em que eu te vi, você nem ao menos me beijou
Aquele cara rico que você vinha se encontrando
Deve ter te arrasado
Então bem vinda de volta, querida
Ao lado pobre da cidade”...