São Paulo e suas contradições. Parabéns, Sampa!

OPINIÃO - Saulo Marcos de Almeida

Data 25/01/2022
Horário 04:30

Alguma coisa acontece no meu coração 
que só quando cruzo a Ipiranga e a Avenida São João
Caetano Veloso

Conheci a cidade de São Paulo quatro anos depois de “Sampa” ser lançada por Caetano Veloso (1978), em disco de vinil, comprado por meu pai para audição dominical da família. Fiquei apaixonado por aquela música e poesia!
Atrevi-me, por um tempo, a pensar que mais simbólico seria se “Sampa” tivesse sido produzida por Paulo Vanzolini ou João Rubinato, “vurgo” Adoniram Barbosa. Eles sim, paulistanos e também gênios da MPB! 
Todavia, a beleza como o vento em plena liberdade, desconhece suas origens e destinos acontecendo/soprando nos versos de um baiano num processo de reconhecimento de um lugar incomum e sem igual... “Sampa”, hino clássico da cidade de São Paulo!
- Com a canção: o desejo de um dia conhecer o famoso cruzamento, eu idealizava.
Em janeiro de 1982 (falecimento de Elis Regina), moço/estudante com 17 anos, na direção de Atibaia para trabalhar num Acampamento de Jovens, a primeira parte da minha viagem teve fim na antiga rodoviária de São Paulo, ao lado da Estação da Luz, Praça Júlio Prestes.   
Como chegara cedo demais, após um “pingado e um pão na chapa” (simbólico na terra da garoa), dentro do terminal, ocorreu-me antes de seguir viagem, “cruzar a Ipiranga e a Avenida São João”. 
Emocionado com a possibilidade de conhecer um pouco daquela cidade e, sobretudo, alegre por não despender dinheiro nenhum para chegar ao local, dirigi-me ao centro de São Paulo para realizar sonho de adolescente, nascido no coração, por meio de uma linda peça musical.
Com jeito de caipira e andar apressado, em minutos “via com meus próprios olhos” o que o compositor baiano chamava de realidade: a famosa encruzada da Ipiranga com a São João. Para saber-se ali, plantei os pés em ambas as avenidas, mesmo arriscando-me a atravessá-las entre tantos carros e pedestres. 
Encantado com o sonho/desejo realizado, encorajei-me um pouco mais até chegar à famosa Praça da República. As aulas de história do antigo 2º grau (ensino médio), ainda na cabeça de estudante, faziam-me lembrar que aquele lugar era representativo para os ideais republicanos (1889), razão porque em uma das suas extremidades fora construída a famosa Escola Normal da Praça (1894). 
Não mais uma igreja a compor o antigo Largo 7 de Abril, mas, um prédio imponente, inspirado em arquitetura europeia em forma de E maiúsculo de Educação (vale a pena ver o prédio do último andar do Edifício Itália), a representar a aliança cívico-republicana: a ciência sobre a fé; a separação do Estado e igreja; a ordem e a escola apontando o progresso do país pela iniciativa de sua maior e mais importante cidade. 
Com fome de guri no horário de almoço, informaram-me sobre o melhor virado à paulista da cidade no viaduto 9 de julho. Ao chegar, a surpresa: o icônico Bar do Estadão nascido ao lado do famoso jornal de mesmo nome. 
Do encanto com “Sampa” ao amor pela cidade, que mais tarde me acolheu como munícipe/morador, a esperança de que passados tantos anos de história, São Paulo, acolha socialmente a população em situação de rua, que hoje soma mais de 30 mil pessoas, em absoluta miséria! “Do povo oprimido nas filas, nas vilas, favelas”. 
Sem falar, infelizmente, na Cracolândia... Exatamente, nos lugares em que moço, alguma coisa aconteceu em meu coração! 
 

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