Hospital Allan Kardec fecha as portas amanhã

Atendimentos psiquiátricos na unidade se encerram nesta quinta-feira e famílias se recusam a receber dez pacientes

PRUDENTE - MARIANE GASPARETO

Data 21/12/2016
Horário 07:22
 

 

Por 55 anos o Hospital Psiquiátrico Allan Kardec, em Presidente Prudente, lidou com problemas que a sociedade se esforçava para ignorar: doenças mentais e dependência de drogas. Depois de cuidar dos marginalizados e enfrentar preconceitos, agora será a vez do próprio hospital também ser jogado para debaixo do tapete. Vítima de uma luta antimanicomial que não veio acompanhada da implantação dos equipamentos necessários, a unidade fechará suas portas amanhã.

Atualmente 58 pacientes eram atendidos pelo "hospital especial", de acordo com Jorge Guazzi, membro da comissão interventora definida pela Justiça para administrar o Allan Kardec. Desde o dia 12 de dezembro, eles começaram a receber alta e ser encaminhados para suas famílias, mas ainda há dez que ainda não têm um destino definido, pois os familiares se recusaram a recebê-los.

Jornal O Imparcial Os 64 funcionários do hospital cumprem aviso-prévio e deixarão atividades no dia 27

"Nós atendíamos 43 cidades da região, então, cremos que essas pessoas serão encaminhadas a seus municípios de origem para receber atendimento", declara Jorge. Outras 12 pessoas contavam com os serviços do "hospital-dia", que funciona das 7h às 17h, com o fornecimento de quatro refeições, atendimento multidisciplinar e oficinas terapêuticas.

Há uma grande preocupação na reinserção social desses pacientes que não permanecerão internados. "O atendimento psiquiátrico exige uma precisão na hora de administrar a medicação, trocar o remédio e aumentar ou diminuir a dosagem. Sem isso a chance de um surto é grande", explica o membro da comissão. Outro problema é que muitos pacientes podem se tornar agressivos ou ceder a tendências de automutilação se não receberem o tratamento devido.

O promotor de Justiça, Mário Coimbra, que acompanha a situação dos hospitais psiquiátricos em Prudente, ajuizou uma ação para que o DRS-11 (Departamento Regional de Saúde) amplie os leitos psiquiátricos do HR (Hospital Regional) Doutor Domingos Leonardo Cerávolo e promova investimentos no ambulatório de saúde mental. "A situação é muito triste, pois vemos uma política de fechamento de leitos, sob o argumento de que a rede ambulatorial dá conta e minimizaria as internações, mas a realidade social é outra, com uma rede ainda em formação sem todos os equipamentos necessários", declara.

 

Problemas financeiros

Os 64 funcionários do local já estão cumprindo aviso prévio e encerram seus trabalhos no dia 27 de dezembro, conforme Jorge Guazzi. Para arcar com as verbas rescisórias de aproximadamente R$ 1,4 milhão será necessário vender um imóvel que hoje é alugado para a Prefeitura, onde funciona uma creche. Ainda assim a unidade deixará aproximadamente R$ 3 milhões em dívidas tributárias.

O principal motivo que levou ao fim da unidade foi uma decisão do Ministério da Saúde de diminuir a quantidade de leitos pactuados no hospital especial (internações) que iriam de 60 para 40, além de não manter a pactuação do "hospital-dia" por entender que o Caps (Centro de Atenção Psicossocial) tem capacidade de substituir esses atendimentos. "O nosso custo operacional não reduziria em praticamente nada, pois exigiria a mesma quantidade de funcionários para manter os atendimentos e as diárias já estão defasadas desde 2002, sem reajuste do valor de R$ 42,30 por leito", expõe Jorge.

 

É o fim?

Apesar de encerrar suas atividades como hospital psiquiátrico, a comissão interventora busca transformar o local em um Centro de Tratamento para Idosos. O MPE (Ministério Público Estadual) possui uma ação compelindo o município a construir essa unidade, que poderia ser implantada onde hoje é o Allan Kardec, podendo atender até 120 pessoas. A medida será negociada com a próxima gestão.

 

SAIBA MAIS

O fechamento do Allan Kardec ocorre um ano após a desativação do Hospital Psiquiátrico São João, em Presidente Prudente, que atendia 40 pacientes. Em agosto de 2014 as duas unidades já ameaçavam fechar se fossem descredenciadas do SUS (Sistema Único de Saúde), mas uma audiência realizada na Justiça Federal determinou a continuidade do atendimento até a implantação da rede de saúde mental.

 
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