Moacyr de Padua Mello nasceu em 1927, em Maracaí, cidade vizinha de Assis, em uma família que valorizava a educação, mesmo sem grandes recursos financeiros. Seu pai fez questão de matricular todos os filhos no Colégio São Bento, em São Paulo, onde Moacyr aprendeu idiomas, piano e recebeu uma formação de excelência. Ainda jovem, passou no vestibular de medicina e se formou na Faculdade Federal do Paraná, em 1950, ano em que a instituição foi federalizada.
Na década de 1940, viajar entre cidades do interior e grandes centros era um desafio. Para facilitar as viagens para estudar em Curitiba (PR) e as visitas à família em Assis, Moacyr, que já voava em um avião mantido em segredo por sua avó religiosa (que posteriormente aceitou a prática), foi presenteado com um avião, modelo Air Coupe, para dois lugares. O presente veio de seu tio Zequinha, casado com a irmã de sua avó materna, que, sensibilizado com as dificuldades de locomoção, comprou essa aeronave, conhecida por sua versatilidade e capacidade de operar em pistas curtas.
O feito era tão inusitado que a cidade parava para ver o jovem estudante chegar de avião. Durante seus estudos em Curitiba, Moacyr também demonstrou grande caráter ao ajudar seu primo, José Norton, que estava "jurado de morte" devido a um relacionamento proibido, dividindo sua comida e planejando sua fuga. O pioneirismo de Moacyr inspirou outros familiares e amigos, como seus primos, a também se aventurarem na aviação. No entanto, a posse do avião pessoal de Moacyr chegou ao fim quando ele já morava em Presidente Prudente e já tinha duas filhas. A esposa, cansada de suas ausências devido a viagens constantes aos finais de semana, e preocupada com as filhas, ameaçou ir embora para Assis, levando-o a vender a aeronave.
Após se formar, aos 23 anos, Moacyr foi convidado a assumir o posto de médico em Iepê, uma cidade com apenas 3 mil habitantes e sem aeroporto. A notícia de que o novo médico chegaria de avião mobilizou toda a população, que nunca havia visto uma aeronave. Um fazendeiro local, Roberto Simões, construiu uma pista de pouso e um hangar para recebê-lo, pois ele próprio tinha um avião, mas não podia usá-lo para ir a Iepê.
A chegada de Moacyr foi um evento histórico, marcando o início de uma nova era para a cidade, que passou a contar com atendimento médico regular e infraestrutura de aviação, sendo "obrigada a ter aeroporto" por sua causa. Em Iepê, atendeu a população urbana e rural com excelência, sendo lembrado até hoje com muito carinho, pois em seu consultório ou em visitas domiciliares, resolvia todos os tipos de casos e em qualquer horário, trafegando com seu Jeep Land Rover com correntes nos pneus nos dias e noites de muito barro. Moacyr foi o único médico de Iepê, por 25 anos, atendendo desde esfaqueados, partos, envenenados da área agrícola, até fraturas, cortes, e pequenas cirurgias.
Moacyr casou-se com Terezinha de Andrade Mello, uma mulher autodidata que aprendeu sozinha italiano, francês e latim, e que se destacou como professora e diretora escolar. A família viveu em Iepê por aproximadamente 18 anos. Em 1970, a família mudou-se para Presidente Prudente, não sem antes uma disputa, pois Moacyr desejava retornar para Assis. No entanto, Terezinha, buscando novas oportunidades profissionais e a necessidade de obter um diploma universitário para ser efetivada como professora (já que o governo passou a exigir), insistiu em Presidente Prudente. Ela conseguiu aulas na Escola Estadual Professora Marietta Ferraz e, com sua determinação, convenceu Moacir a se mudar, onde ele assumiria cargos de destaque na saúde pública a partir de 1971.
Em Presidente Prudente, Moacyr assumiu um cargo como médico sanitarista no Palácio da Saúde em 1971. Em 1972, tornou-se o primeiro médico do trabalho da cidade e um dos primeiros do Brasil, após se especializar na USP (Universidade de São Paulo), onde também cursou a especialização em Sanitarismo. Embora o campo da medicina do trabalho ainda não existisse formalmente no Brasil na época, ele guardou o diploma e só pôde atuar nessa área a partir de 1984 em São Paulo e 1986 em Presidente Prudente, quando abriu sua clínica.
Como médico sanitarista, chefiou a Divisão Regional de Saúde, coordenando a fiscalização de 44 distritos, incluindo inspeções em alimentos. Também se especializou em doenças pulmonares, realizando um curso em Lisboa (Portugal) sobre tuberculose, e manteve um consultório particular por décadas, atuando como clínico geral e especialista em doenças pulmonares.
A honestidade era um valor presente na família de Moacyr, contam os filhos. Seu avô, que possuía diversas casas lotéricas e de jogo, foi um exemplo notável: quando o governo proibiu o jogo, ele vendeu todos os seus bens para garantir que nenhum de seus muitos funcionários ficasse sem receber o que lhe era devido. A trajetória de Moacyr, por sua vez, foi marcada pelo compromisso com a ética, a dedicação à família e o incentivo à educação.
Moacyr de Padua Mello exerceu a medicina por 64 anos, dos quais cerca de 50 em Presidente Prudente. Ele continuou a exercer a profissão até os 92 anos, mesmo após ser diagnosticado com Parkinson por volta dos oitenta e poucos anos. Como médico, ele conseguiu "driblar" a doença, mantendo uma rotina ativa, com natação e caminhadas em sua propriedade rural, e contando com um motorista fornecido pelo governo para suas atividades profissionais. Faleceu em 2019, aos 92 anos, deixando um legado de pioneirismo, coragem e humanidade. Sua esposa, Terezinha, faleceu em 2013, aos 79 anos, sendo lembrada como exemplo de inteligência, elegância e força.
O exemplo de Moacyr e Terezinha inspirou as filhas e netos, que seguiram caminhos de liderança, honestidade e dedicação ao próximo. A história da família Mello é um retrato da transformação do interior paulista, marcada por inovação, superação e valores sólidos que atravessam gerações. O casal teve duas filhas, Francis Teresita Oliveira Mello, que mora em Presidente Prudente, e é mãe dos netos de Moacir e Terezinha, Rafael Mello Fontolan Vieira, especialista em cirurgia robótica, e o advogado Rodrigo Fontolan Vieira; e Dalva Mello, executiva de sucesso, CEO da Bray do Brasil, mãe do médico Eric.
Arquivo pessoal
Moacyr e Terezinha, embarcando em seu pequeno avião para a lua de mel em Buenos Aires (Argentina), em 07/07/1957; ele teve que pousar o Air Coupe em Porto Alegre (RS) devido ao mau tempo, e seguiu viagem em avião comercial