Notas do fim do intercâmbio  

OPINIÃO - Helber Henrique Guedes

Data 29/11/2025
Horário 05:00

Chego ao fim deste intercâmbio com a sensação estranha — e bonita — de que vivi vários anos em poucos meses. É curioso pensar que tudo começou com aquele primeiro texto, onde eu tentava nomear o desconhecido: a cidade, os trajetos, os medos, as pequenas descobertas, as primeiras aulas na UNQ, o espanhol tímido que ia esbarrando nos encontros. Hoje, ao escrever estas notas finais, percebo que não é mais possível separar o que eu vivi do que eu me tornei.
Buenos Aires e Parque Chas me ensinaram muitas coisas que não cabem em avaliações formais. Aprendi a caminhar sozinho e, ao mesmo tempo, a depender dos outros. Aprendi que confiar é sempre um risco — mas é também o que dá sentido às relações. Aprendi que a vida se sustenta nos detalhes: no mate compartilhado, nos metrôs lotados, nos corredores da universidade, nas conversas que acontecem quando a aula termina e ninguém quer ir embora.
As aulas de Pedagogia Social foram, sem dúvida, o coração desse processo. Não somente pelos textos de Deligny, Cornu, Meirieu, Moyano, Freire, mas pela forma como foram vividas. Pelas saídas a território, pelo chão que nos obrigava a pensar com os pés, pela presença da docente que não ensinava apenas conteúdos, mas modos de estar no mundo. A visita ao La Calle, aos espaços culturais, às juventudes criadoras de futuro, tudo isso ampliou meu repertório e, ao mesmo tempo, me devolveu ao que eu já fazia no Brasil, mas com outro olhar.
Também carrego os encontros humanos: colegas que viraram afeto, professoras que viraram referência, conversas que viraram força para continuar pesquisando, militando, trabalhando pela cultura e pela educação. Encontrar a professora lançando seu livro justamente no meu último dia na UNQ pareceu um símbolo que virou um fechamento bonito, daqueles que a vida só permite quando estamos atentos.
Volto ao Brasil com outra postura diante do território. Com mais cuidado, mais escuta, mais desejo de construir coletivamente. Volto sabendo que a educação não é neutra e que nenhum vínculo se sustenta sem responsabilidade. Volto sabendo que confiança não se pede, se conquista. E que caminhar é parte do método.
No fim, o intercâmbio não foi uma pausa na vida: foi um prolongamento dela. Um capítulo necessário para eu entender quem sou, o que faço e para onde quero seguir.
Levo comigo as travessias, os afetos, os aprendizados — e uma certeza suave: a de que sigo em movimento.

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