Quando alguém me diz que "não consegue" manter um estilo de vida saudável por muito tempo, já imagino o que vem a seguir. A pessoa começa cheia de boas intenções: decide fazer exercícios, promete reduzir o açúcar, jura que vai dormir mais cedo. Nos primeiros dias, tudo vai bem. Mas, de repente, a rotina toma conta e os velhos hábitos voltam, como se tivessem vida própria. Isso não é falta de força de vontade nem preguiça. Na maioria das vezes, é o ambiente nos puxando de volta para o que é familiar.
Um estudo clássico da Universidade de Duke ajuda a entender esse fenômeno. Pesquisadores acompanharam estudantes que se mudaram para outra universidade, com novos dormitórios, colegas diferentes e uma rotina completamente nova. Eles perceberam que muitos comportamentos automáticos, como assistir TV à noite, ler o jornal em um lugar específico ou se exercitar sempre no mesmo horário, simplesmente desapareciam quando o ambiente mudava. Esses hábitos só se mantinham quando o novo cenário lembrava o antigo. O comportamento, mais do que uma questão de decisão, estava ancorado no contexto.
Uma boa forma de visualizar isso é pensar no hábito como um trilho de trem. Enquanto o trilho está montado, o trem sempre passa pelo mesmo lugar. O trilho, nesse caso, é o ambiente: o sofá voltado para a TV, o celular ao lado da cama, a gaveta cheia de doces. Quando você muda o cenário, é como se retirasse um pedaço do trilho. O trem já não segue sozinho, precisa de comando.
O trabalho com os estudantes mostrou exatamente isso. Ao mudar de ambiente, o piloto automático perdeu força e as pessoas passaram a agir mais por decisão consciente. Em vez de simplesmente repetir, elas escolhiam.
Na prática, o que isso significa? Se você quer dormir melhor, comece retirando o celular do quarto e estabelecendo um horário fixo para desligar as telas. Se precisa controlar a alimentação, não deixe doces à vista. Se deseja criar o hábito de se exercitar, prepare a roupa com antecedência e torne o caminho até o local do exercício o mais simples possível.
Perceba que, em todos esses exemplos, a estratégia não é lutar contra o impulso a cada dia, e sim reorganizar o ambiente para que o impulso tenha menos espaço. Você deixa de depender apenas de motivação e passa a contar com a ajuda do ambiente.
Como cardiologista, vejo diariamente que pequenas mudanças de cenário sustentam grandes mudanças de comportamento. Ao ajustar o ambiente, abre-se espaço para uma nova rotina e, com ela, para um coração mais protegido.
O ponto central é simples e, ao mesmo tempo, desafiador: em vez de culpar apenas a si mesmo quando um hábito não muda, observe o cenário que o cerca. Pergunte-se que objetos, horários e pessoas costumam puxar você para o velho padrão. Ao identificar esses gatilhos e modificá-los, você transforma o ambiente em aliado, não em adversário. Isso faz diferença concreta.