Final dos anos 60, começo dos 70. A televisão ainda era um luxo para poucos, mas o rádio dominava as casas brasileiras. Foi nesse cenário que o jovem Cesar Crepaldi, o Cesinha, começou a moldar sua identidade musical. “Era fácil ligar o rádio e ouvir Beatles, Rolling Stones, Creedence... além de Mutantes e toda uma cena nacional também influenciada pela gringa”, lembra.
A paixão tomou forma em 1974, quando, após ganhar do “Papai Noel” um toca-disco três em um, Cesinha iniciou sua jornada como colecionador. O gatilho definitivo para aquele jovem da década de 70? “Foi quando ganhei da namorada do meu irmão o primeiro álbum do Rush, banda canadense. Aquilo me virou de ponta cabeça. A partir dali, eu só pensava em rock and roll.”
ROCK IN RIO 1985: A
AVENTURA INESQUECÍVEL
A primeira edição do Rock in Rio foi um marco na vida de Cesinha. Ele viajou com amigos prudentinos em um trailer acoplado a um caminhão. “Tinha cozinha, banheiro, tudo. Para a época, era um luxo. E eu fui com a perna recém-operada por conta das varizes, precisava ficar 30 dias afastado do banco e aproveitei para realizar esse sonho.”
No festival, ele viu de perto nomes como Ozzy Osbourne, Iron Maiden, Scorpions, Whitesnake e AC/DC. “Fui especialmente para ver o Ozzy. Tinha acabado de sair do Black Sabbath. Mas a grande surpresa foi o Whitesnake, com o David Coverdale em início de carreira solo. Foi mágico.”
A COLEÇÃO DE
4 MIL HISTÓRIAS
Atualmente, Cesar estima ter mais de 4 mil títulos entre vinis e CDs originais. Desde 1974, todo dinheiro extra virava disco. “Eu pedia cupons na porta da antiga Agência Lima, na Joaquim Nabuco. A cada dez discos, você ganhava um. Eu mentia que precisava só de mais um cupom... e consegui muitos assim”.
Seu acervo inclui desde rock progressivo até hardcore, punk e trash metal. E há raridades: compactos do Sex Pistols que hoje chegam a valer R$ 5 mil. Mas o maior valor, para ele, é sentimental. “Meu item mais valioso é o primeiro disco do Rush. Ele que mudou minha vida.”
UM ESTÚDIO
SÓ PARA ELES
Hoje, a coleção está guardada num estúdio particular, criado especialmente para isso. Organizados por ordem alfabética e estilo, os discos estão bem acomodados em uma estante projetada para preservá-los. “Também tenho uma seção chamada “novos”, onde deixo os últimos títulos comprados para não correr o risco de adquirir repetidos”.
Equipado com som de alta qualidade, o espaço é um refúgio. "Ali eu ouço shows, revejo apresentações e respiro rock”, conta. “O rock é meu oxigênio”, diz Cesinha, sem exageros. Ele ouve rock todos os dias, no carro, em casa, no trabalho. A paixão atravessou gerações: seu filho mais novo é baterista, guitarrista e também respira música.
O “STAGE DIVING”
Profissionalmente, o rock também mudou a vida de César Crepaldi. Em 1979, estreou no rádio no programa de Walthair Greghi na antiga Rádio Comercial 2. “Era estreia da FM, que hoje é 98 FM. Eu estreei lá e articulava alguma coisa, levava os discos para o Walthair Greghi tocar e participar do programa. Então começou ali aquele momento de como eu diria que me influenciou na minha trajetória pessoal e profissional”.
César criou o programa “Stage Diving” em 1991, que até hoje é transmitido aos domingos, às 20h, pela Web Rádio Rock. “Exatamente depois em 1991 o ex-deputado, Paulo Lima, me convidou. Já era amigo de infância dele e ele me convidou a apresentar um programa de rock na rádio que estava estreando em Prudente, que hoje é a Rádio Fronteira. Era a Rádio Educativa 106 FM, e ali eu comecei com o programa 'Stage Diving' que virou a minha trajetória de vida, de trabalho. Passei a fazer isso da minha vida, além de ser bancário, eu fazia isso também paralelo e foi seguindo ficando só no rádio que é uma profissão, já que eu estou apresentando o programa 'Stage Diving' há mais de três décadas. Já são 33 anos no ar. Hoje, a internet dá esse fôlego que o rádio tradicional já não tem mais”.
A EVOLUÇÃO DO GÊNERO
Cesinha observa que o rock, ao longo das décadas, se reinventou com influências do blues, jazz, ópera, folk e até música nordestina, como no caso dos Raimundos. “A mistura é o segredo da evolução do gênero”, pontua. Ele também destaca os avanços tecnológicos, como novos pedais, amplificadores, e a produção digital. “Tudo isso trouxe mais qualidade, mais possibilidades”
Mesmo fora do mainstream, ele acredita que o rock jamais morrerá. “O rock está vivo. Os bares tocam, o Sesc traz bandas, temos o Thermas do Rock e a Feira do Rock no Matarazzo. As garagens ainda ecoam. A chama segue acesa.”
ROCK EM PRUDENTE:
LEGADO E RESISTÊNCIA
Se depender de Cesar Crepaldi, o rock em Presidente Prudente jamais sairá de cena. “Eu levantei essa bandeira nos anos 70 e sigo carregando até hoje”, afirma com orgulho. Segundo ele, a cidade sempre foi um polo importante para o gênero na região, superando inclusive centros maiores como Londrina e Maringá em termos de mobilização cultural.
Cesinha lembra que foi um dos entusiastas que ajudaram a idealizar o Thermas do Rock, evento do Sesc que já se tornou tradição na agenda cultural do município. “Desde o início, estive junto, incentivando, participando. E é muito gratificante ver o evento crescendo, abrindo espaço para as bandas e para o público”, destaca.
Embora tenha dado uma pausa na organização de festivais após a pandemia, segue ativo na cena: participa de shows, promove excursões para grandes festivais — como o Monsters of Rock, em São Paulo — e participou de uma roda de conversa ontem, na Audiotec, em alusão ao Dia Mundial do Rock.
“O curioso é que essa data, 13 de julho, só é celebrada no Brasil. Lá fora, ninguém dá tanta importância. Mas aqui pegou”, comenta.
Além dos festivais, Cesinha enaltece a força dos bares e das bandas locais. “Tem rock rolando quase todo fim de semana. O Sesc também traz atrações de fora, o que mantém a cena aquecida”. Ele também ressalta o papel da Feira do Rock, realizada mensalmente no Centro Cultural Matarazzo, onde discos, camisetas e itens temáticos são vendidos em meio a encontros de gerações.
SAIBA MAIS
ONDE ENCONTRAR CESINHA?
Quem quiser ouvir um pouco dessa história em som e palavras, pode acompanhar o programa Stage Diving aos domingos, às 20h, na Web Rádio Rock.
Arquivo pessoal
Cesar Crepaldi em encontro com Stve Harrys, baixista e líder do Iron Maiden, nos idos de 1994 quando a banda esteve em São Paulo
Primeira edição do Rock in Rio foi um marco na vida de Cesinha
César criou o programa de rádio “Stage Diving” em 1991 na Rádio Educativa 106 FM
Acervo inclui mais de 4 mil discos, desde rock progressivo até hardcore, punk e trash metal